quarta-feira, fevereiro 27, 2013

Resumo do livro Pintores e Poetas de Rilhafoles de Júlio Dantas de 1900

Embora Dantas, influenciado pela nova psiquiatria italiana do final do século XIX, tenha conferido à arte dos loucos um nível estético nulo, a importância que lhe deu a nível psiquiátrico fez com que criasse um documento importantíssimo para a história da Arte Bruta de Portugal. Várias vezes o autor faz a comparação da arte dos pacientes com vários artistas e movimentos da época remetendo ambos para uma arte degenerada. Este é um livro de essência estética fascista e dogmática usando a arte Outsider como o mau exemplo a seguir. Vou deixar o 4º capítulo inteiro na publicação a seguir, pois são 12 descrições de pacientes, das suas doenças e das suas obras, o escritor divaga entre admiração e a repulsa em relação aos poetas e pintores de Rilhafoles, penso que o último será Ângelo de Lima, o poeta.

I - A ideia de fazer esta monografia surgiu ao autor ao observar a colecção de Miguel Bombarda em Rilhafoles, influenciado por um artigo de 1989 de um psiquiatra americano chamado Ales Hrdlicka. Considera que a loucura sempre fez parte da história de Portugal inclusive de Reis e Rainhas, defendendo que para um crítico de arte é necessário conhecer a arte dos manicómios para a diferenciar da arte oficial.Para o autor embora sendo uma arte menor, a arte dos loucos tem uma grande importância para a psiquiatria, pois os doentes ao não conseguirem exteriorizar o seu sistema delirante através de uma comunicação verbal, pode-no exteriorizar através duma pintura ou de uma carta.

II - É reforçada a ideia de que a colecção de Rilhafoles em geral é bastante vulgar, com valor estético mínimo ou nulo, o grande valor é exclusivamente psiquiátrico. São os delírios e as alucinações transportados para o papel que originam estes documentos plásticos. Tal como a paranóia que alastra para fora dos muros dos "manicómios e alastra, cá por fora, dando os revolucionários, os anarquistas, os malucos, os santos, e toda essa galeria de figuras de cera da literatura e da arte decadente, a que é de uso chamar simbolistas, místicos, neo-goticos, bizantinos, pré-rafaelitas, e vários outros nomes de gíria bárbara criados com pior ou melhor fortuna pelos pseudo-génios da Dissolução."

III - A paranóia é a única raça de loucura compatível com a vida social, sendo a decadência artística o primeiro sinal da fraqueza de um povo e o início do fim de uma raça.

IV - Em Rilhafoles há muito mais pintores que grafómanos, pois predominam os analfabetos. O autor prossegue valorizando alguns dos artistas loucos. Os grafómonos exprimem-se através de várias técnicas: autobiografias, cartas eróticas, folhetos reformatórios, jornais e sátiras hospitalares.

V - Dantas faz uma divisão em nove categorias e descreve-as:
a) Anacronismo. Regressão -  A mente de um paranóico é um regresso aos antepassados ancestrais e de si mesmo. Sistematizações arcaicas aplicadas como sistematizações superficiais com origem na ignorância.
b) Simbolismo, Alegoria - Os loucos são primitivos, demonstram-no  por exemplo na obsessão pelo religioso e na ressurreição arcaica das histórias dos príncipes e dos réis. "A verdadeira característica da regressão paranóica não é a escolha do motivo obsoleto; é o anacronismo da maneira, da intenção, do processo, da técnica, o recuo da visão estética, do sentimento da cor e do sentimento da forma, todo esse ar de manifesta primitividade que faz regressar de muitos séculos a arte."
c) Simetria - Quanto menor é a inteligência de um doente maior é a tendência para a simetria
d) Cromofilía - Os pacientes muitas vezes desenham pequenas figuras geométricas simplesmente pelo prazer de as colorir. Muitas vezes procuram a intensidade do colorido, buscando a violência, a cracocromia. É comum recortarem papel de cor e colar no desenho.
e) Auto-reprodução somática - Os artistas loucos estigmatizam sempre as suas características, reproduzindo-se a si mesmo nos seus trabalhos.
f) Onomatopoiése, neologismo - O calão, a gíria criminal, a gíria dos malandros é usada também pelos paranóicos, maníacos, epilépticos e criminosos natos. Falta um estudo do calão popular em Portugal
g) Incoerência - Muitos dos documentos escritos são criados sem uma lógica, a repetição é bastante comum, a mistura de diversos contextos, linguagem fragmentaria, grotesca. Por vezes o paciente cria uma gíria individual descrevendo as suas alucinações ou ideias, um verdadeiro «calão
paranóico», que torna ás vezes difícil a interpretação dos seus documentos.
h) Erro egocêntrico - Interpretação errada do exterior, perverte e deforma o mundo circundante face ao seu ego. Daí o estranho e monstruoso das criações do paranóico, quando referidas ao seu sistema delirante.
i) viciações epilépticas - Júlio Dantas reforça a ideia de que não há um sequer génio neste hospital psiquiátrico, descrevendo as características negativas.

VI - Todas as características anteriormente referidas podem ser vistas nalguns dos nossos pintores e poetas mais altamente cotados. É a arte decadente a que mais pontos de contacto oferece com a arte manicomial. É preciso mostrar à crítica a arte manicomial, para que a arte sã evite os seus defeitos para poder educar a grande massa que não sente, nem pensa por si.

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